sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Francisco Souto Neto: LEMBRANÇAS DO CÁRCERE MAMERTINO E SUA CRUZ INVERTIDA


Jornal Centro Cívico – Ano 9 – Agosto/Setembro 2011 – Nº 86
Jornalista responsável: Maurício Grabowski

Página 15:


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LEMBRANÇAS DO CÁRCERE MAMERTINO E SUA CRUZ INVERTIDA
Francisco Souto Neto

Segundo antigo ditado, uma vida inteira não é suficiente para conhecer Roma. Depois de algumas viagens à Cidade Eterna, o turista que já visitou as suas principais atrações sente aumentar uma inquietação ao perceber que as particularidades da capital da Itália, ligadas a uma história de quase 3000 anos, são incontáveis, e cada vez mais fascinantes. Se alguém viajar acompanhado de familiar ou amigo, é sempre necessário planejar com antecedência os locais que desejam conhecer, debater as opiniões de todos os participantes, e estabelecer as prioridades.
No último passeio que fiz a Roma, que foi na companhia de Rubens Faria Gonçalves, tínhamos ambos o propósito de conhecer o Cárcere Mamertino, também denominado Cárcere Tuliano, uma prisão subterrânea que já existia no 1º século depois de Cristo. São Pedro e São Paulo estiveram ali aprisionados, além de enorme número de importantes personalidades de várias eras, tais como reis, governadores, senadores, ministros. Não se tratava de um lugar para prisioneiros comuns, mas para os de segurança máxima, isto é, os inimigos públicos. Eles eram condenados à morte dolorosa, geralmente por estrangulamento. Desse martírio só escapavam aqueles que, por sorte, morressem antes por causas naturais, isto é, de frio, fome ou doenças. No ano de 314 o Papa Silvestre dedicou a prisão a São Pedro em Cárcere (San Pietro in Carcere), nome da igreja que foi construída sobre aquele lúgubre local. No século XVI, a essa igreja foi sobreposta outra, denominada São José dos Carpinteiros (Chiesa di San Giuseppe dei Falegnami). A entrada dessa igreja está situada a uns quatro metros acima da rua, devido a obras realizadas na década de 30 do século XX, que baixaram o nível da praça em frente, para permitir o acesso direto ao Cárcere Mamertino.

Entrando no Cárcere Mamertino

A entrada para o Cárcere Mamertino se faz por uma escadaria que começa no atual nível da rua, exatamente sob a fachada das igrejas sobrepostas, que se aprofunda paralela à calçada, onde há quatro janelões, que à distância parecem enormes portas abertas, mas que estão protegidas por grades, para que os transeuntes não caiam no desvão.  Descendo por essa escadaria, o visitante chega a um nível profundo, onde se encontra a chamada cela superior, abafada e sem janelas. Numa das paredes está fixada imensa placa de mármore gravada com os nomes dos prisioneiros mais famosos que ali encontraram a morte dolorosa. Ao lado do nome, consta a causa mortis e o ano da execução. Uns eram decapitados, outros estrangulados, outros morriam “de fome”, e assim por diante. A cela inferior da masmorra era alcançada através de um buraco no chão, em que colocavam uma escada de madeira para a descida dos prisioneiros, de onde somente sairiam, ou mortos, ou para serem executados. Dizia-se, já naqueles tempos remotos, que aquela escada de madeira era uma descida para os infernos. Atualmente há uma escada de pedra num canto que foi aberto para que os visitantes possam descer sem maiores riscos. Esse plano inferior da prisão, úmido, está ligado ao principal esgoto da cidade, que se chamava Cloaca Máxima. Às vezes, quando o prisioneiro era executado naquele local, costumavam jogar o corpo ao esgoto, ali ao lado.
Há uma fonte no chão. Como a iluminação local era fraca, não conseguíamos ver o interior do buraco. Rubens Faria Gonçalves testou-o com uma das mãos... e encontrou a água. Segundo a lenda, quando São Pedro estava ali aprisionado, fez brotar aquela fonte, que antes não existia, e com a sua água batizou 42 outros prisioneiros, e também os dois guardas do cárcere, que se chamavam Processo e Martiniano. Esses guardas foram igualmente condenados e supliciados. Outro milagre atribuído a São Pedro teria ocorrido no momento que ele descia pela escada de madeira para aquela escuridão, quando foi brutalmente empurrado por um dos guardas contra a parede. Quando o santo bateu o rosto no obstáculo de pedra, esta teria amolecido, e parte do seu rosto ficou ali impresso. Segundo a tradição cristã, houve mais um milagre por São Pedro: as correntes que o prendiam, soltaram-se e caíram ao chão. Essas correntes estão expostas numa das mais importantes igrejas de Roma, que se chama Igreja de São Pedro Acorrentado (Chiesa di San Pietro ai Vincoli).
Nesse piso mais profundo há um altar, o que faz do cárcere uma capela. A cruz desse altar está invertida, alusão a São Pedro, que saiu dali para ser crucificado de ponta-cabeça. Ao lado do altar existe uma coluna onde, segundo a lenda, estiveram acorrentados Pedro e Paulo. Não resta dúvida de que a visão daquela cruz invertida causa grande impressão às pessoas que visitam o pavoroso calabouço.
Saímos daquele espaço abafado e escuro. Subimos ao piso superior da masmorra e dali outros degraus nos levaram para o nível da rua. Encontramos a paisagem ensolarada, e uma brisa reconfortante nos trouxe de volta à Roma atual. Partimos para novos passeios, porém com o pensamento ainda aprisionado ao lugar horrendo que acabáramos de visitar.

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A cruz invertida no altar de São Pedro, no nível mais profundo do Cárcere Mamertino.

Esta gravura do século XIX mostra como era a fachada da igreja (a menor, do lado esquerdo) que foi construída sobre o Cárcere Mamertino.

Ao fundo, a Igreja San Giuseppe dei Falegnani, construída sobre o Cárcere Mamertino. À direita, veem-se as colunas e a escadaria da fachada de outra igreja, a Chiesa dei Santi Luca e Martina. Em primeiro plano, Rubens Faria Gonçalves. Dá para ler na fachada da igreja ao fundo, a palavra MAMERTINUM. Foto de Francisco Souto Neto.

A Chiesa dei Santi Luca e Martina sobre o Cárcere Mamertino.

Na calçada, uma pessoa olha para baixo, através da grade, onde está a porta de entrada ao Cárcere no subsolo.

A inscrição MAMERTINUM indica onde é o cárcere, que se situa no subsolo.

Um desenho mostra os níveis subterrâneos do Cárcere.

Ao nível da calçada, a entrada (aqui fechada) para a escada que desce aos dois níveis subterrâneos do Cárcere Mamertino. Essa entrada localiza-se assim, de lado.

As duas escadas que levam do nível da rua à porta de entrada ao Cárcere.

Uma turista entrando no cárcere.

No primeiro subsolo do Cárcere Mamertino há hoje uma capela. À esquerda, vê-se uma escada que sobe para a saída, e outra escada que desce ao nível mais profundo e tétrico do cárcere.

Numa das paredes do nível da capela, há uma tenebrosa placa de mármore informando alguns dos mais importantes prisioneiros que ali estiveram, e a maneira como foram mortos...

Eis a cruz invertida no altar de São Pedro, no nível mais profundo do Cárcere Mamertino.

Outra placa indica que São Pedro, acorrentado com São Paulo a este local, batizou 47 prisioneiros e dois guardas (que depois foram também mortos por causa disso). 

Uma fonte brotou neste local, cuja água foi usada por São Pedro para os batismos (a fonte, ou "poço", está iluminada nesta foto.

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UM RESUMO DE APENAS 4 MINUTOS, NUM FILME EM VHS DE 1999: NÓS NO CÁRCERE MAMERTINO, O CAÓTICO TRÂNSITO DE ROMA E NOSSO HOTEL: O MANFREDI, NA RUA MARGUTA (RUA ONDE MORARAM CELEBRIDADES, COMO FEDERICO FELLINI E SUA DOCE GIULIETTA MASINA):


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Jornal Água Verde: VISCONDE DE SOUTO - ASCENSÃO E "QUEBRA" NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL


Jornal Água Verde – Ano 19 – 2010  
Diretor presidente: José Gil de Almeida

Página 20:


 Detalhe:


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Jornal Água Verde: VISCONDE DE SOUTO – ASCENSÃO E “QUEBRA” NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL

Os primos Francisco Souto Neto e Lúcia Helena Souto Martini estão, desde 2007, pesquisando e escrevendo a biografia de seu trisavô António José Alves Souto, o visconde de Souto (1813-1880).
            Expoente do Segundo Reinado, o visconde de Souto foi o primeiro banqueiro particular de que se tem notícia no Rio de Janeiro. Sua casa bancária, A. J. A. Souto & Cia., popularmente conhecida como Casa Souto, rivalizava com o Banco do Brasil em carteira de depósitos. Ao falir em 10 de setembro de 1864, episódio historicamente conhecido como “Quebra do Souto”, arrastou de roldão outros bancos e cerca de cem empresas. O passivo da Casa Souto equivalia à metade da dívida pública interna do Brasil.
            Desde então, o visconde de Souto foi citado num enorme número de livros, em maior ou menor profundidade, quer como personagem do seu tempo, quer como protagonista da Crise de 1864. Dentre as centenas de autores dessas obras, vale mencionar alguns, como Machado de Assis, Lima Barreto, José de Alencar, Arthur Azevedo, visconde de Mauá, barão do Rio Branco, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda, Ruy Barbosa, Afonso Arinos, Teófilo Ottoni, Pedro Calmon, Raymundo Faoro, Gilberto Freire, Wilson Martins, Victor Viana, Luís Viana Filho, Werneck Sodré, Eduardo Bueno... e outros.
            O visconde de Souto foi presidente da Beneficência Portuguesa e fundador da Junta de Corretores, que deu origem à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Fez parte da primeira diretoria da Caixa Econômica Federal.
            Duas propriedades do visconde de Souto tiveram grande fama à sua época. A primeira foi a Chácara do Souto, onde residia, em São Cristóvão, que confinava com os terrenos da mansão do Chalaça e com a Quinta Imperial da Boa Vista.  Na chácara instalou uma coleção de animais vivos da fauna brasileira e também importados da Europa e África, o primeiro zoológico brasileiro, que abria gratuitamente à visitação aos domingos. A segunda foi a Fazenda Bela (ou Boa) Vista, cujo proprietário anterior, conde de Gestas, já tornara famosa por receber ali, frequentemente, a visita do rei D. João VI e, anos mais tarde, do seu filho D. Pedro I e família imperial. Nessa fazenda, em parte um cafezal, situada onde é hoje a Floresta da Tijuca, o visconde de Souto mandou construir um oratório que continua existindo, a Capela Mayrink, nome do seu último proprietário.
            Pelos casamentos dos filhos, aparentou-se com as famílias de marquês de Olinda, conde de Ipanema, visconde de Pirassununga e Euzébio de Queiroz.
            Quando da falência da Casa Souto, o imperador D. Pedro II, de quem o visconde era amigo, mandou instaurar uma comissão de inquérito para determinar as causas da crise e suas responsabilidades, tendo sido o visconde de Souto inocentado em 1866 e reabilitado publicamente pelo Conselho de Estado em 1869.
            Esta obra, que tem como ponto focal a Crise de 1864, também descreve o panorama social, político e econômico do Brasil oitocentista, enquanto relata a maneira como surgiram as primeiras casas bancárias neste país e como os bancos foram tomando as feições de como hoje os conhecemos.
Os autores optaram por transcrever trechos de livros, documentos e cartas, assim mantendo a visão pessoal e direta de cada escritor que se referiu ao visconde, à sua casa bancária e à Quebra do Souto.
            Souto Neto e Lúcia Martini ainda não têm patrocinadores. Mas prevê-se que essa obra revelará fatos históricos que estão arquivados na Biblioteca Nacional, SPHAN, Arquivo Nacional, Real Gabinete Português de Leitura, IHGB, Museu Histórico Nacional, Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, e outros, praticamente desconhecidos até mesmo de historiadores.

Legendas originais em 2010: Foto 1 – Visconde de Souto (1813-1880), fotografia acervo Museu Histórico Nacional. Foto 2 – Capela do Souto (hoje Capela Mayrink) mandada construir pelo Visconde de Souto em 1850. Fotos 3 e 4: Os autores Francisco Souto Neto e Lúcia Helena Souto Martini.

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Francisco Souto Neto: O UNIVERSO PICTÓRICO DE RUBENS FARIA GONÇALVES


Jornal Palco – O Jornal da Classe dos Artistas – Ano I – Nº 3 –  6 a 13 Junho 2009
Diretor responsável e reportagens: Passos Camargos

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Páginas 8 e 9:


Detalhe do texto do jornal:


Jornal Primeiro Lance – Leilões & Outros – Ano VIII – Nº 439 – 12 a 20 Junho 2009
Diretor responsável e reportagens: Passos Camargos

Capa:


Páginas 8 e 9:


Detalhe do texto de Souto Neto:



O UNIVERSO PICTÓRICO DE RUBENS FARIA GONÇALVES

            Acompanhei o trabalho silencioso de Rubens Faria Gonçalves ao longo do tempo. Silencioso, porque Rubens criava para satisfazer a sua necessidade íntima de uma busca estética através da manifestação pictórica baseada em pesquisa e seriedade, e os seus trabalhos não eram exibidos senão a uns raros amigos que frequentavam seu estúdio. Realmente, ele não expressava a necessidade de mostrar a sua obra, nem com ela competir em certames artísticos.
            Fomos nós, uns poucos amigos, que conseguimos convencê-lo a começar a dar a público a sua arte. E ele iniciou, quase timidamente, expondo no I SBAI – Salão Banestado de Artistas Inéditos, quando foi premiado pela comissão julgadora daquele certame, composta dos renomados artistas plásticos Mazé Mendes, Alberto Massuda e Jair Mendes.
            No estúdio do artista, nas ocasiões em que vi a superfície branca ser cingida pelos tons fortes e a espátula espargindo cores que os pincéis alinhavam, houve sempre um som ao fundo, fosse no cristal da voz de Elis Regina, na cadência maravilhosa de Billie Holliday, ou na rouquidão cheia de indagações e sensualidade de Marlene Dietrich, ou ainda em árias conhecidas interpretadas por Maria Callas. Dessa amálgama, das mãos do artista que se movem ao som dos amplificadores e que se mancham das cores fortes que usa, nascem as figuras humanas, enigmáticas, às vezes etéreas, os braços das misteriosas mulheres que abarcam os limites da tela, e as expressões dos rostos, tudo isso na composição de um universo que não procuro entender, nem decifrar. A mim, basta sentir a profunda impressão que me causa a sua pintura, e a emoção do resultado estético advindo do fecundo momento mágico em que o nascimento de uma obra de arte, dum artista autêntico, se completa. (Escrito por Francisco Souto Neto, a convite, para os dois jornais, de São Paulo, de Passos Camargos).

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Francisco Souto Neto: CABO NORTE E O SOL DA MEIA-NOITE: É AQUI QUE O MUNDO ACABA


Jornal Água Verde – Ano 19 – Maio 2009
Diretor presidente: José Gil de Almeida

Página 16:


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CABO NORTE E O SOL DA MEIA-NOITE: É AQUI QUE O MUNDO ACABA
Francisco Souto Neto

O Sol da meia-noite sempre povoou a minha imaginação na infância. Quando eu soube da existência desse Sol lendário e, na minha ingênua meninice, quase improvável, pedi a meu pai que me explicasse tal fenômeno. A eclíptica, o efeito giroscópio, rotação, translação, solstício: a explicação paciente e detalhada de meu pai sobre um fenômeno físico perfeitamente normal, não me impediu imaginar a Terra girando no espaço, balançando, indo e vindo ao redor do seu eixo, num mágico ritmo de dança cósmica. E ficou em mim, para sempre, a idéia de que existia um lugar no mundo, onde o astro-rei, durante dias e semanas, permanecia aparentemente dando voltas pelo éter celeste sem jamais tocar a linha do horizonte.
Adulto, fui à Noruega no auge do verão para tornar real o meu sonho da infância. O confortável navio em que eu viajava subiu através da costa norueguesa, cheia de fiordes e pequenas cidades encantadoras, até atravessar o Círculo Polar Ártico e entrar na região em que, naquela época do ano, o Sol não se põe.
Durante os dias em que navegamos pelo Oceano Ártico, sempre houve ceias e grandes festas à meia-noite, em louvor à presença permanente do Sol. A primeira cidade do Ártico em que o navio parou, foi Hammerfest, cujo símbolo é o urso polar. Dali zarpamos em direção a Honnigsvag, a cidade mais ao norte da Noruega, onde chegamos por volta das 22 horas do dia 9 de junho. Naquele porto, esperavam-nos alguns ônibus para levar-nos em excursão ao Cabo Norte.
Embora fosse o auge do verão europeu, a temperatura estava perto de zero grau. E durante o percurso de Honnigsvag ao Cabo Norte, pude apreciar a estranheza da região. A paisagem parece uma colcha de retalhos irregulares em branco e preto, porque a terra é negra, recoberta por áreas esparsas de neve. Não nascem árvores naquela região. A única espécie vegetal que ali sobrevive são musgos ralos e muito rasteiros que se desenvolvem sobre as pedras, numa área com profundo caráter ártico. Não há nada que se assemelhe ou a que se possa comparar. É uma paisagem única, selvagem, que só não pode ser chamada de monótona porque, aos nossos olhos de habitantes dos trópicos, é fascinante em sua estranheza e solidão.
Às vezes se vê alguma rena correndo entre os blocos de gelo, ou pastando na tundra. E por duas ocasiões avistei tendas de lapões, que lembram aquelas dos índios americanos dos filmes de faroeste, com uma diferença notável: sobre a tenda, expõe-se um chapéu. Se ele é de dois bicos, seu habitante é casado. Se de quatro bicos, é solteiro. Os lapões, ou samis, são os povos indígenas do Círculo Polar Ártico. De raça branca, eles vivem da caça, pesca e criação de renas.
A chegada ao Cabo Norte (Nordkapp) é marcada por um imenso complexo arquitetônico, grande parte subterrâneo, contendo lojas e restaurantes. A partir dali, em breve caminhada, chega-se à borda de um penhasco de 307 metros de altura, um promontório que cai a pique na confluência do Mar do Norte e Mar de Barents, no Oceano Glacial Ártico. Um monumento na forma de um globo terrestre vazado, com uns cinco metros de altura, marca o ponto mais setentrional do continente europeu.
A noite estava nublada, mas vez ou outra as nuvens abriam-se, e através delas o Sol lançava seus raios dourados sobre as águas oceânicas. À meia-noite, com o astro-rei alternando-se entre mostrar-se e esconder-se, algumas pessoas abriram garrafas de champanha e levantaram brindes ao fascinante Sol da meia-noite.
Além daquele promontório, existem só algumas ilhas e, depois, a calota polar. É o lugar onde o continente europeu acaba. Por isso, costuma-se dizer: “Se aqui termina a Europa, é aqui que o mundo acaba”.
Afastei-me das pessoas que falavam animadamente. Fazia frio e ventava. Minha curiosidade fazia-me vivenciar a iluminação irreal, estranha e oblíqua, quase horizontal, o silêncio rompido apenas pelo som do vento, os raios do Sol infiltrando-se e parecendo mover-se por entre as nuvens. Senti-me noutra dimensão. Foi o meu reencontro com o menino que fui um dia e que vive ainda em mim.

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É PIQUE, É PIQUE, É AU AU AU por Kamila Mendes Martins


Gazeta do Povo – Caderno Animal – 2 de maio de 2009 – Nº 30
Editores responsáveis: Deise Campos e Adriano Justino
Diretor de Redação: Nelson Souza Filho

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Páginas 6 e 7:

Detalhe:



É PIQUE, É PIQUE, É AU AU AU por Kamila Mendes Martins

            (...) Como ainda não existem empresas em Curitiba voltadas especificamente para esse nicho de mercado, o organizador do evento pode optar pela compra de produtos em lojas de festas que têm todos os adereços que não devem faltar em qualquer comemoração. É o que faz o professor aposentado Rubens Faria Gonçalves. “Todos os anos em janeiro celebro com os amigos o aniversário do meu cão Tibério Bouledogue. Compro os enfeites, pratinhos, chapéus, enfim, tudo o que necessário, nas casas de festas”, diz ele. O professor, que mora sozinho com seu buldogue francês de 6 anos, diz que o cachorro adora quando outras pessoas estão em casa. “Além disso, este é mais um motivo para reunir os amigos e jogar conversa fora”. (Kamila Mendes Martins).


Convidados do Tibério: Bernadete, Cleusa,
Souto Neto, Farah Diba e Tatiane.

Convidadas do Tibério.

Rubens Faria Gonçalves com
Tibério Bouledogue aos 6 anos.

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Francisco Souto Neto - DUBAI: OUSADIA, DESLUMBRE E DELÍRIO


Jornal Água Verde – Ano 18 – Dezembro 2008 – Nº 331
Diretor presidente: José Gil de Almeida

Página 13:


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DUBAI – OUSADIA, DESLUMBRE E DELÍRIO
Francisco Souto Neto


Emirados Árabes Unidos é o nome de um pequeno país debruçado sobre o Golfo Pérsico. Sete emirados formam a nação, cujo território, com apenas 83.600 km² (menor do que a área do Estado brasileiro de Santa Catarina) é um deserto semi-árido, abrandado por alguns oásis. Com uma produção de petróleo insignificante em proporção à dos seus ricos vizinhos, era um país inexpressivo em termos de turismo até muito recentemente.

Projetos ousados

Entretanto, em meados da década de 1980, o xeque (“sheik” em inglês) de Dubai, Mohammed bin Rashid Al Maktoun, concebeu um ambicioso plano para transformar aquela inexpressiva cidade na mais ousada do mundo, em termos de avanços tecnológicos e arquiteturais, de modo a tornar-se pólo de atração turística mundial. E em apenas vinte anos, concretizou projetos absolutamente surpreendentes. O primeiro deles, foi acrescentar área ao território, criando arquipélagos artificiais, como o Palm Islands, em forma de palmeira, para abrigar elegantes vivendas e enormes hotéis. Dois outros arquipélagos muito maiores estão em construção, bem como um quarto conjunto de ilhas com a forma do mapa-múndi, tão grandes que são avistadas do espaço sideral.
A avenida principal cingiu-se de edifícios futuristas que ultrapassam os 60 andares. Até há pouco tempo, o Hotel Burj Al-Arab era o símbolo de Dubai, erguido no mar, com 321 metros de altura, evocando a vela de um barco. Porém, desde 2005 está sendo construindo outro edifício, o Burj Dubai, que em 2009 será inaugurado como o prédio mais notável e mais alto do mundo.

O Burj Dubai

No site oficial do Burj Dubai, consta que no dia 19 de outubro de 2008 o prédio alcançava a altura de 730 metros. Para que se tenha uma idéia comparativa, basta dizer que o Pão de Açúcar tem 396 metros e o Corcovado 710. Portanto, mesmo ainda inacabado, o Burj Dubai já é mais alto do que o pico que ostenta o Cristo Redentor. Quando concluído, o prédio deverá ter 818 metros.
O desenho do Burj Dubai foi feito por Skidmore, Owings e Merrill, os mesmos arquitetos da Sears Towers (no momento o mais alto prédio dos Estados Unidos, em Chicago, com 108 andares e 442 metros de altura) e da futura Freedom Tower de Nova York. Quando concluído, o Burj Dubai será decorado pelo italiano Giorgio Armani, cujo hotel – o Hotel Armani – se instalará nos seus primeiros 37 andares. Do 45º andar ao 108º, haverá aproximadamente 700 apartamentos privados. Os pisos restantes do total provável de 180 andares serão, supõe-se, ocupados por escritórios.
Ao redor do andar térreo do Burj Dubai, constrói-se uma área vastíssima que englobará 30 mil residências, nove hotéis e dezenove torres residenciais com cerca de 40 andares cada.
O Edifício Burj Dubai mantém um site com notícias quase diárias do progresso da sua construção, desde que essa foi iniciada no ano de 2005, e que pode ser consultado em http://www.burjdubaiskyscraper.com/
O que impressiona nos Emirados Árabes Unidos é a pujança e o desejo de crescer e de se superar. Para criar-se um belíssimo e eficiente sistema metroviário (já em construção avançada) bastou ao xeque estalar um dedo. As composições do metrô de Dubai foram concebidas com linhas aerodinâmicas e suas estações lembram naves espaciais da ficção científica. Bem a propósito, não há nada no mundo que se assemelhe tanto aos desenhos das metrópoles imaginadas pelo criador de Flash Gordon, quanto a cidade de Dubai. Em termos de vontade política, essa cidade deveria servir de exemplo aos políticos brasileiros, tão habituados a prometer em tempo de eleições a realização de “grandes” obras (na verdade bem modestas, em relação ao que se vê realizado no mundo) e nada cumprir.
Agora anuncia-se em Dubai a construção de um prédio que superará o Burj Dubai. Será o “Tall Tower Aka Al-Burj”, que terá mais de um quilômetro de altura, mais de 200 andares e será inaugurado em 2020. Dubai é ousadia, é deslumbre, é um delírio arquitetônico.  

Legendas originais: Foto 1 – O arquipélago artificial Palm Islands. Foto 2 – Burj Dubai, ainda em construção, mas já o mais alto edifício do mundo. Foto 3 – Aka Al-Burj, próximo projeto de Dubai: mais de 200 andares, mais de um quilômetro de altura.

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OBSERVAÇÃO ACRESCENTADA EM 14.10.2011:

Ao ser inaugurado em 4 de janeiro de 2010, com 828 metros de altura, o nome do prédio foi alterado para Burj Khalifa.

Burj Khalifa, em 2011
o edifício mais alto do mundo.

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terça-feira, 11 de outubro de 2011

Jornal Centro Cívico: VISCONDE DE SOUTO - ASCENSÃO E "QUEBRA" NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL


Jornal Centro Cívico – Ano 6 – Novembro 2008 – Nº 57
Editora Responsável: Elaine C. Bento Prada

Páginas 8 e 9:


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Jornal Centro Cívico: VISCONDE DE SOUTO – ASCENSÃO E “QUEBRA” NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL.
Francisco Souto Neto


Desde o ano de 2006, eu e minha prima Lúcia Helena Souto Martini, que reside em Paulínia, SP, estamos pesquisando e escrevendo a biografia do banqueiro António José Alves Souto, o Visconde de Souto, nosso trisavô.

A importância do Visconde de Souto

O biografado nasceu em 1813, na cidade do Porto, Portugal, e veio para o Rio de Janeiro em 1829, aos 15 anos. Cinco anos depois estabeleceu-se por conta própria, criando a casa bancária A. J. A. Souto & Cia, conhecida como Casa Souto, precursora dos bancos privados no país. Pelo decreto nº 439, de 24.9.1857, o Souto passou a ser oficialmente o banqueiro da Casa Imperial do Brasil. Ele foi presidente da Beneficência Portuguesa e fundador da Junta de Corretores que deu origem à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Fez parte da primeira diretoria da Caixa Econômica. Era Comendador da Ordem da Rosa até que, em 1862, recebeu o título de Visconde, concedido pelo rei de Portugal, D. Luís I. Em sua chácara no bairro carioca de São Cristóvão, criou o primeiro jardim zoológico do Brasil, que franqueava à visitação pública. Em 1860, na Fazenda Bela Vista, onde plantava café, o Visconde de Souto mandou construir um oratório, hoje conhecido por “Capela Mayrink”, nome do seu último proprietário.

Capela Mayrink, mandada construir pelo Visconde de Souto
na sua Fazenda Bela Vista. Foto Sílvia Maria Pinheiro Grumbach.

          Pelo casamento dos filhos, aparentou-se com as famílias de Marquês de Olinda (Regente e Primeiro-Ministro do Brasil Imperial), Visconde de Pirassununga, Conde de Ipanema e Euzébio de Queiroz (Senador e Ministro do Império).


O Visconde de Souto, OST de A. R. Duarte, 1890. Acervo da
Beneficência Portuguesa - Rio de Janeiro. Foto por gentileza
de Ney O. R. Carvalho.

A Chácara do Souto, residência oficial do Visconde, confinava com a Quinta Imperial da Boa Vista. Documentos da época atestam que o Imperador frequentava a Chácara do Souto para jogar xadrez com seu anfitrião e amigo.

Dona Maria Jacintha de Freitas Souto,
a Viscondessa de Souto. OST de A. R. Duarte, 1875.
Acervo do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro.


            Em 1864 a Casa Souto foi à falência, gerando a maior crise da história financeira do país, conhecida como "Quebra do Souto”. Segundo Ney O. R. Carvalho, na página 54 do livro “Bolsa de Valores do Rio de Janeiro – 150 anos – A História de um Mercado”, com base em outros autores e documentos de posse do Arquivo Nacional, conta que o passivo da Casa Souto equivalia à metade da dívida pública interna do Brasil. A partir do gravíssimo episódio da Quebra do Souto, surgiu o sistema financeiro como hoje o conhecemos, com a separação da emissão de papel-moeda da de notas à vista, ambas então feitas pelo Banco do Brasil. Por ordem do Imperador, foi instaurada uma comissão de inquérito para apontar os culpados pela crise. A conclusão veio em 1866, inocentando o Visconde de Souto. Ele havia saldado quase todas as dívidas, às custas do seu enorme patrimônio pessoal. Reconquistou a confiança pública e continuou trabalhando como corretor de fundos até sua morte, em 1880, aos 66 anos.

Autores e livros já publicados

            Muitos escritores referem-se ao Visconde de Souto como personalidade de seu tempo, e à “Quebra do Souto”, em livros que são marcos da Literatura Brasileira. Citam-no autores como Machado de Assis, José de Alencar, Lima Barreto, Visconde de Mauá, Barão do Rio Branco, Afonso Arinos, Ruy Barbosa, Nelson Werneck Sodré, Wilson Martins, Pedro Calmon, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda, Eduardo Bueno e muitos outros. Mais de 300 livros de inumeráveis autores mencionam o Visconde de Souto e a Quebra do Souto em português, inglês, francês, espanhol, alemão e holandês. Na Bibliografia do livro que estamos escrevendo, essas mais de 300 obras [consultadas até 2008, data deste artigo] vão relacionadas por ordem alfabética dos autores, seguidas do título de cada livro, nome da editora e ano da publicação, com a indicação dos números das respectivas páginas onde o Visconde é mencionado. As mais importantes revistas do Século XIX, Archivo Pittoresco e Semana Illustrada, e jornais de várias épocas, fazem referências ao Comendador e Visconde de Souto.

O Visconde de Souto. Fotografia sem data.
Acervo do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro.

            Os poetas modernistas Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, no livro que escreveram em coautoria, “Rio de Janeiro em Prosa & Verso”, lançado pela José Olympio Editora no ano de 1965, preservam a memória do Visconde de Souto no capítulo “Tu passaste por este jardim”, sob o título “O Jardim Zoológico do Souto”, transcrevendo o seguinte, nas páginas 91 e 92:

            “A geração de hoje conhece de nome o Souto – pela notícia que tem da quebra de sua casa bancária, em 1864, arrastando em seu desmoronamento outras casas e bancos e levando a praça à grande crise comercial que tão profundamente a abalou.
O Souto, António José Alves Souto, foi um negociante português que, aqui chegando menino, pelo seu trabalho assíduo e inteligente, reuniu uma fortuna considerável e alcançou um crédito ilimitado.
Tão grande era a confiança que nele se depositava que sua casa bancária, em seu tempo, rivalizava, como carteira de depósito, com o Banco do Brasil, a mais importante instituição bancária do país.
Depositário de uma soma avultadíssima de haveres, mergulhado em inúmeros negócios a que a sua atividade não podia atender a um tempo, a Casa Souto ruiu, ocasionando prejuízos consideráveis no comércio do país e que se traduziram num verdadeiro cataclismo de que ainda hoje se fala com pavor.
Possuidor de grande fortuna, Souto era um espírito liberal e generoso. Tendo construído para sua habitação um belo palacete na Rua Barão de Monte Alegre, em meio a um grande e bem tratado parque, aí organizou um jardim zoológico, onde reuniu, à custa de muito trabalho e grandes despesas, muitas e variadas espécies dos mais interessantes animais do globo. Até um elefante existiu no jardim zoológico do Souto.
Organizado o parque, foi ele franqueado ao público e, durante muito tempo, foi o ponto predileto de reunião e passeio dos fluminenses nos domingos.
Sem as facilidades de locomoção que hoje existem, era a pé, pelo extenso caminho do aterrado, que os caixeiros, que recebiam dos patrões seis vinténs para se divertir nos domingos, iam passear à Chácara do Souto, o que não lhes custava nada”.

            Escritores contemporâneos continuam mencionando o banqueiro português. Eduardo Bueno, no livro “Caixa – Uma História Brasileira”, edição de 2002, narra como o Visconde de Souto ofereceu os salões da sua mansão para que a diretoria recém-empossada da Caixa Econômica, da qual ele fazia parte, tivesse onde realizar as primeiras reuniões:

            “A Caixa Econômica tem suas dívidas para com o Comendador Alves Souto: além de ceder os aposentos de sua residência para cerca de dez reuniões do Conselho, foi ele quem providenciou a mobília da sala da Câmara dos Deputados, no prédio da Cadeia Velha (onde atualmente se ergue o Palácio Tiradentes), na Rua da Misericórdia, onde ficara decidido que a Caixa, na falta de local mais apropriado, iniciaria suas atividades”.

            Lilia Moritz Schwarcz e Lúcia Garcia, no livro “Registros Escravos”, lançado em 2006, revela na página 215 um raro episódio de “generosidade pública”: o Visconde de Souto várias vezes comprou escravos para imediatamente alforriá-los, isto é, para dar-lhes a liberdade por puro humanitarismo.

A Quebra do Souto

            A notícia da Quebra do Souto chegou aos jornais portugueses a bordo do vapor Guienne. De Lisboa foi transmitida a Londres por cabo submarino, tendo o jornal “The Times” divulgado a notícia na página 10 da edição de 17.10.1864 e dias seguintes. Jornais de Nova York (Estados Unidos), Wellington (Nova Zelândia), e Sidney (Austrália) também noticiaram a Quebra do Souto.

            No Brasil, não faltaram anedotas envolvendo a crise. Uma delas, que encontramos em jornais da época e em alguns livros, dizia que a Casa Souto ruíra com tamanha repercussão, que através de todo o Império, da corte aos remotos sertões, até os papagaios não paravam de gritar e repetir: “O Souto quebrou! O Souto quebrou!”...

Documentos históricos

Ao escrevermos “Visconde de Souto – Ascensão e ‘Quebra’ no Rio de Janeiro Imperial”, decidimos manter incólume a linha da realidade. Tudo o que estamos relatando tem base documental. E esta não vem apenas das centenas de livros pesquisados, mas sobretudo de documentos arquivados em instituições como: Arquivo Nacional, Biblioteca Nacional, Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, Cúria Metropolitana, IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e outros.

Além de resgatar a figura do Visconde de Souto, o livro será um guia para melhor entender a economia brasileira da metade do Século XIX, explicando o mecanismo que fez nascer as primeiras casas bancárias no Brasil. A obra será prefaciada por Dalmiro da Motta Buys de Barros, ex-presidente do Colégio Brasileiro de Genealogia.
Além da cota que caberá aos patrocinadores do livro, que ainda não temos, este será distribuído gratuitamente a universidades, bibliotecas e pesquisadores de todo o país e alguns no Exterior.

Curitiba, agosto de 2008.

Legendas originais: 1ª foto – Visconde de Souto (acervo da Beneficência Portuguesa – Rio de Janeiro). 2ª e 3ª fotos: – Os autores Francisco Souto Neto e Lúcia Helena Souto Martini.

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